Eu guardo uma coleção de fotos suas esmagando o
Simba, a
Clara, o
Mercv e a
Guda em espaços onde, teoricamente, caberia apenas um gato. Você só tinha tamanho, Pufosa — e patas de leoa! Suspeitava que
perder a mãe, último porto seguro, seria um grande baque. Mas não te imaginava partir menos de quatro meses depois e apenas dois dias na sequência da
Pipoca.
Há 16 anos, vocês também
chegaram mudando tudo. E de tutora de bigodes em quantidade normal (quatro, meu número da sorte) virei protetora de dez, ainda imaginando que conseguiria doar, se não a golpista da barriga, ao menos a ninhada. Como cansei de desabafar aqui, porém, quem separa uma família que segue mamando com 2 anos? Você, inclusive, foi a mais persistente.
E, por mais que tenha me esforçado para compensar as ausências, não podia lamber sua cabeça — sou alérgica a gatos, né? Embora neste final, hei de confessar, afundei a cara no seu pelo fininho e macio (surpreendentemente cheiroso!) mais de uma vez, enquanto chorava. Por causa dele, aliás, você é Pufosa — inicialmente Bufosa, até a gente descobrir que se tratava de "arma de fogo, pistola, berrante". rs
Não que você não berrasse, mas só na hora das guloseimas. Bastava ouvir o barulho da latinha abrindo de manhã ou do sachê rasgando nos fins de semana, que aparatava na cozinha, atropelando os irmãos. E continuou vindo mesmo doente, sem conseguir comer quase nada. E, quando andar ficou mais difícil, me encarava com os farolões azuis, de qualquer lugar da casa, esperando ansiosa pelo potinho.
Só você ganhou sachê batido em todas as seringadas dos últimos dias, com sabores variando. Nem parecia a criatura de gosto duvidoso que adorava
recomer vômito (o próprio e os alheios), em um processo apelidado de micro-ondas, pelo aquecimento natural — se eu soubesse que, exclusivamente na
ração úmida, você não vomitaria mais, teria nos poupado todo o estresse com o
megaesôfago, o
chiclete de dente, a
gastrite. Me desculpa?
Talvez, você também aproveitasse outras coisas do
gatil, além da grama que crescia no meio da cinerária, perigosamente mais saborosa. Engraçado que só você não quis se isolar no jardim nessa fase. Preferiu, sim, ficar sem as irmãs no escritório, mas acho que era porque o colchão, herdado com o sofá (que você amou) do
cantinho novo, acomodava melhor sua
artrose.
Ontem, a gente leu juntas e trocou carinhos, cada uma no seu estilo. Na hora de dormir, vesti a fraldinha, porque o banheiro havia ficado longe demais, mesmo sem sair do lugar. Ainda acordei às 4h14 para um chamego extra — fraldinha seca, patê para o estômago não doer, mais carinho. Você ronronou e gastou o miado economizado há dois dias, agora sei que em despedida.
Leo te pegou mais uma vez, três horas depois, em um sono tranquilo, enroladinha. Acordada por um pesadelo com o Simba e os gritos da Keka na porta do quarto, só cheguei a tempo de te botar no colo e repetir, grogue de sono, que estava ali.
Bon vivant, claro que você morreria no domingo. O primeiro em que não pediu sachê.