Este é um post difícil de escrever. Primeiro porque soa incompetência ter um animal sob nossa guarda vítima de uma doença tão tosca. Depois porque, esteticamente, a miíase, nome pomposo da bicheira, também não ajuda — imaginem uma centena de larvas se requebrando dentro da cavidade ocular, com o Zé do Caixão ameaçando levar sua alma à meia-noite.
Em minha defesa, o
carcinoma da Clara está em estágio avançado, dois veterinários justificaram que o cheiro é extremamente sedutor para as moscas (até ataque de formigas a coitada sofreu!) e tentei de spray natural de óleo de neem no pelo a coleira fortunosa (e
polêmica) da Bayer — tampar o machucado aumentaria a coceira, que já causa bastante desconforto.
Depois do trauma de remover mecanicamente larva por larva, com a pinça travando no osso (eu, que desmaio fazendo exame de sangue!), fiquei expert em caça aos ovos e não os deixo mais evoluir. Antes de compartilhar todas as infos da jornada, porém, preciso explicar que decidi não levar a retalhinha à clínica para evitar o estresse, em um quadro já delicado, mas fui orientada a distância pelo vet. E não publicarei fotos do carcinoma porque impressionam.
Comecemos, então, pelo
básico: falei em ovos e moscas, sem deixar clara a conexão, né? Moscas botam ovos em tecidos em decomposição, se alimentam de fezes, escarros, secreções, produtos animais e vegetais estragados, sempre mais ativas durante o dia, e vivem até um mês — sim, há milhares de espécies, que depositam o raio do ovo em outras, impossibilitado identificar a meliante, portanto basta dizer que este texto não serve para a berne (miíase furunculoide), uma nojeira diferente da bicheira.
Retomando: a
prevenção da nossa (infelizmente) miíase foca em manter o ambiente higienizado, incluindo os banheiros dos gatos, e a comida tampada — até porque você tem gatos, rs. Se o peludo possuir lesão na pele, limpe diariamente, proteja com gaze, caso a região permita, use coleira ou spray antimosca (existem versões naturais de ambos) e tome cuidado redobrado em áreas rurais.
Os
ovos dessas moscas são pequenos, durinhos, colocados sobrepostos e bem-fincados na pele — não estranhem. Quando o tecido está morto, fica mais fácil remover o bloco — se sobrar unzinho, dançou.
E não quero tocar o terror, mas eles eclodem em 24 horas — depois viram larva, pupa e mosca adulta. Quanto maior a temperatura e a umidade, mais rápido ocorrerá esse ciclo, que pode durar de dez a 14 dias. As
larvas costumam ficar escondidas, principalmente porque conseguem entrar na pele.
E, como são muitas, acabei usando um ectoparasiticida para facilitar a
remoção — não vão comprar kombucha, hein? A embalagem improvisada foi empréstimo de uma amiga.
Elas se mexem bastante, aliás, o que provoca coceira, um dos
sintomas. Inchaço subcutâneo é outro. No caso da Clara, o local também passou a sangrar mais. E ela ficou tão incomodada que deve ter virado a madrugada em claro porque dormia comendo no dia seguinte. Imagino que a dor deixe alguns pets amuados e sem apetite.
O que mais falta falar? Ah! Bicheira
não tratada pode causar abscessos, necrose, hemorragia, toxemia (acúmulo de toxinas) e até matar. Desde que a gente
se mudou para Araçoiaba, já tirei algumas centenas de ovos do carcinoma da Clara. Enquanto ela puder aproveitar o sol no gramado, o patê na colherinha e o carinho no colo, vale a pena.
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