Você não mora em um casarão nem está a fim de arrumar confusão com a família, mas fica se coçando de vontade de ajudar os bigodes e focinhos que vivem nas ruas toda vez que lê um post sobre as aventuras do coração de pudim aqui no
Gatoca? Foi por isso que eu aceitei o convite da Kuka Fischer e da Otávia Mello para participar do I Encontro Nacional de CED.
Eu até sabia que a sigla significava "captura, esterilização e devolução animal". Só que precisava de mais argumentos para convencer os leitores deste blog (e a mim mesma) a praticar a última parte. Seis anos colecionando doações de comercial de margarina fazem a gente torcer o nariz à ideia que alguns bichos nunca terão uma família. Mas é a mais pura verdade. Não existem lares para todos. E nem todos (leia-se "os ariscos") querem um lar.
E lá rumei eu ao centrão para assistir às palestras da Maria Quideroli, idealizadora do projeto Operação Gato de Rua (SC), da Fernanda Conde, veterinária especializada em castração precoce, da Neide Ortêncio Garcia, funcionária do Centro de Controle de Zoonoses de São Paulo, do Feliciano Filho, deputado estadual (com direito a conversa do lado de fora), e da Otávia, amiga e fundadora do Felinos Urbanos (MA).
Entre a latinha de Jesus, presente do Maranhão, e os cupcakes coloridos do lanche de encerramento, muita coisa bacana foi dita. Com o olhar de jornalista, eu fiz então este resumo sobre o que um novato cheio de vontade de mudar o mundo precisa saber para transformar teoria de CED em prática. Relatos de veteranos nos comentários são bem-vindos.
Por que castrar
Nos últimos seis anos, a população humana cresceu 3,6%, a canina 60% e a felina 152%. Logo, logo, vai ter mais bicho do que pessoas no planeta. Passando fome e frio. A solução está na castração por saturação. É preciso esterilizar, segundo Feliciano, entre 75% e 85% dos animais de um bairro e, só depois, partir para outro. Enquanto o poder público se omite, nós podemos quebrar o galho fazendo nossa parte.
Como proceder
Primeiro, você vai precisar de uma armadilha ― animais de colônia dificilmente vêm no colo. O ideal é que ela seja acionada manualmente, para o bicho não fugir sem pisar no gatilho e para evitar a captura de gambás, lagartos e outras criaturas que não integram nosso público-alvo. Depois, deve-se escolher para atuar um lugar de abandono frequente, como parques, cemitérios ou construções abandonadas.
Prepare a armadilha com uma comida atrativa, espere o peludo entrar, leve-o para casa e dê ração antes do período de jejum. No dia seguinte, se o veterinário disser que está tudo bem, ele pode ser castrado com a técnica do gancho, criada pelo Werner Payne, que tem um pós-operatório tranquilo, pois o corte é minúsculo, e não precisa de retorno para tirar os pontos.
Não esqueça de pedir o cortinho na orelha, para identificar que aquele animal já foi esterilizado e não sofra com novas capturas. A devolução pode ser feita após 24h, no local de origem, porque o bicho estará medicado com antibiótico, anti-inflamatório e analgésico de efeito prolongado. Deixe potes de comida e água, para ajudar no pós-operatório.
Exceções
Animais domiciliados que vivem soltos são devolvidos para os (ir)responsáveis ― sim, eles também entram na dança! Bigodes e focinhos doentes ou dóceis não devem voltar para a rua. O primeiro grupo precisa de tratamento e o segundo pode realizar o sonho da casa própria.
Edward,
Flea, Snow e os
bebês do cemitério de Santos não me deixam mentir. Peça ajuda aos amigos com a divulgação.
Fêmeas barrigudas darão mais dor de cabeça. Se você resolver soltar, logo a bichinha estará prenhe outra vez e não vai querer entrar na armadilha. Se resgatar e esperar o nascimento dos filhotes, corre-se o risco de a mãe rejeitar a cria (e até comer os pequenos) por estresse. A decisão pela castração imediata dependerá de um veterinário que tope e de internação, já que a recuperação demora mais tempo.
Colônias que sofrem com envenenamento, atropelamento, fome e maus-tratos precisam ser remanejadas. Escolha uma área verde ou uma construção abandonada, com a permissão dos donos ou responsáveis, claro, que tenha fonte de alimento e água, pouco tráfego e vizinhos amigáveis. O local pode ou não ser habitado por outros bichos ― basta colocar os novatos longe até rolar a adaptação.
Sopa no mel!
Quer pegar mais segurança? Comece o trabalho em uma comunidade carente. Elas são a origem dos animais de rua, já que as famílias costumam não ter o mínimo nem para elas mesmas, e o manejo contará com a colaboração dos donos dos peludos ― um contato de confiança, para sensibilizá-los, facilitará bastante a vida.
Antes de colocar a mão na massa, faça um levantamento dos bichos que vivem no local (sexo, idade, condição de saúde). Invista na conscientização dos moradores sobre a importância da cirurgia, incentivando a castração precoce. E não deixe de separar uma grana para os bigodes e focinhos que precisam de tratamento para poderem ser operados.
Também vale a pena atuar no controle de zoonoses, doenças transmitidas a seres humanos ― vermífugo e vacinação são essenciais nesses lugares. Outra coisa importante é pedir para o responsável assinar um termo escrito de comprometimento com a cirurgia e de responsabilidade pelo animal, evitando futuros perrengues.
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