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20.5.09

Eu preciso desligar para amamentar, sorry!

Aceitar abrigar bebês de um mês que não se viram sozinhos é bem diferente de se imaginar dissolvendo Pet Milk em água fervendo a cada três horas. E enquanto Patrícia me passava as instruções de como cuidar dos microgatos do cemitério de Santos, às 23h do dia 4, eu lamentava mentalmente o fato de freelancers não terem direito à licença maternidade.

Os bigodinhos pesavam menos que um punhado de presunto e caíam de cima do rolo de papel higiênico como quem despenca de um edifício. Na primeira refeição improvisada, com patê aguado na seringa, joguei 60% do conteúdo em mim mesma, 20% na blusa da coitada e 10% na parede do outro lado quarto, porque os ingredientes mais duros entalavam no bico o tempo inteiro.

A estratégia de estimular xixi e cocô com um algodão úmido também foi fracassada. Vezes três. Àquela madrugada, não cheguei a dormir 4h, de preocupação. São Francisco deve ter se penalizado com a minha situação e, no dia seguinte, Boo aprendeu a comer no pratinho com Fandangos, o filhote mais autônomo das duas ninhadas.

Acontece que assim eles davam muito mais trabalho, porque juntava a falta de foco com a descoordenação, obrigando-me a passar cerca de 40 minutos resgatando as pragas de dentro dos potes, recolhendo a papinha que caía para fora, separando brigas, caçando fugitivos dispersos. A limpeza das patas e cabelos durava mais meia hora. E ainda tinha a sessão banheiro.

O granulado higiênico até ostentava umas melecas indistinguíveis. Mas como saber as respectivas autorias? Na terceira manhã, achei melhor pedir ajuda ao veterinário aqui do bairro. Por incrível que pareça, não me ocorreu que vagina, projeto de pênis e ânus deveriam ser esfregados de forma diferente (os primeiros na vertical, de cima para baixo, e o último na horizontal). A nova tática era infalível. E o cocô da Boo saiu com uma lombriga de filme.

No quarto dia, os camundongos já haviam trocado as mamães de pelúcia pelo meu colo. Bastava eu sentar no chão para que eles viessem correndo se amontoar, ronronando. E quando eu me dirigia à porta, levava três bolas de pêlo penduradas na barra da calça. Ziggy não tremia mais para andar, usava a caixa de areia com menos timidez e até arriscou umas lambidas na comida da irmã.

No sexto dia, eu precisei deixá-los sozinhos durante o almoço (a mamadeira fora completamente abolida do cardápio) e encontrei patê esmagado até atrás do armário. Fandangos quase morreu afogado na tigela de água. Ninguém ligou para as bolinhas de papel arremessadas com entusiasmo. Outra semana passou voando e eu decidi facilitar as coisas, apresentando os peludos à Baby Cat amolecida.

Claro que eles só toparam a substituição quando a fome se tornou insuportável. De vingança, na sexta-feira, Boo acordou com o olho esquerdo completamente colado. E no domingo eu reparei que o queixo do Ziggy estava machucado. Fandangos, aliás, continuava barrigudo. Toca viajar para Utinga, em plena na segunda-feira de trabalhos atrasados.

Dr. E. receitou um colírio para a rainha do apitaço, sugeriu trocar as vasilhas de plástico por recipientes de vidro, cerâmica ou alumínio, para ver se a irritação do pequeno diminuía, e só não deu outra dose de vermífugo para todo mundo porque eu esqueci de comprar a versão gotas.

Nesses 17 dias, os bebês evoluíram assustadoramente. Mas ainda me rodeiam como patinhos em volta da mamãe pata. E devem achar um absurdo eu ter outras prioridades na vida além de aquecê-los. A cada mordida ardida, fico pensando por que seus dentinhos afiados não conseguem mastigar os quadrados insignificantes da ração seca. Será que estraguei as crianças com batata-frita e refrigerante?

Para ampliar, cliquem na imagem


Epopéia dos bebês na busca por um lar:


:: Como tudo começou
:: Entre algodões e mamadeiras
:: Dicas para cuidar de filhotes
:: Adoção tripla!

16.5.09

Seu futuro a espera

Peggy foi encontrada filhotinha, em frente a um prédio da zona norte. Estava tão assustada que se escondia embaixo dos carros para fugir das pessoas. Quase dois anos se passaram, a pequena alcançou o porte médio, mas continua morando no canil coletivo da clínica veterinária que a acolheu, ignorando que, do lado de fora do portão de madeira, há cachorros que passeiam sem hora para voltar, que ganham cafunés nas orelhas três vezes ao dia, que brincam de caçar chinelos velhos, que roubam comida da mesa do jantar.


Com tanto tempo ocioso, ela aprendeu a dançar com a parede...

...a simular enfartos...

...e até a assobiar.

Agora, precisa de um dono paciente para voltar a confiar no ser humano (tanto que recebe com festa as meninas que trocam sua ração todas as manhãs). Se você conhece um coração de pudim com esse perfil, escreva para fabiana@mopibichos.com.br. E faça uma criança feliz!

Se você queimou 25 neurônios e não lembrou de ninguém, ao menos ajude esse sorriso esperançoso a rodar a internet.

12.5.09

E não é que nós ganhamos?

O certificado do Prêmio Abril de Jornalismo 2009 chegou hoje, pelo Sedex, junto com o catálogo chiquérrimo dos melhores trabalhos (texto, arte, fotografia e multimídia) publicados nas revistas e sites da editora, em 2008. Para quem pegou o bonde andando, a matéria da Nova Escola que contou com a minha participação de presidiária levou a estatueta na categoria "educação". Eis a justificativa:

A reportagem apresenta de modo responsável um diagnóstico dos principais problemas da educação brasileira. Discute caminhos e soluções. Oferece, ainda, uma excelente análise sobre a formação dos professores. A edição utiliza recursos como boxes, gráficos e tabelas que ressaltam a apuração meticulosa. O texto, claro e bem editado, traça uma radiografia precisa da qualidade do corpo docente no país e mostra como isso impacta nas salas de aula. Uma matéria grandiosa, com execução exemplar.

:)

10.5.09

Especial: Dia das Mães 2009

Mãe que é mãe de verdade dá de mamar para bigodes cheios de dentes, não se importa de lamber dúzias de bumbuns por dia, come cocôs fugidios enquanto os pequenos não aprendem a usar o banheiro.

Irmã mais velha até se esforça para quebrar o galho, mas arremessa comida longe (inclusive na própria roupa), perde horas tentando estimular xixis com um punhado de algodão em vão e ainda leva uma salva de gritos dos bebês.

Esse post é uma homenagem à Guda, que eu passei a admirar ainda mais depois de pilotar a primeira mamadeira de Pet Milk.

Veja também: Especial de Dia das Mães 2008

7.5.09

Aniversariante do mês – maio de 2009

Hoje, faz dois anos que Guda* deu o golpe da barriga em Gatoca. Eu pensei em retribuir a gentileza presenteando-lhe com os bebês do cemitério de Santos (e me livrando das 200 mamadas diárias), mas mudei de idéia ao lembrar que já não tive coragem de separar a família original – motivo da superpopulação local.

Deixei-a escolher, então, entre a bolinha florescente com guizo e o ratinho de penacho no traseiro, ambos enviados do Canadá pela Marcia, leitora querida do blog. Só que a (ainda) barriguda trocou tudo por uma sessão de massagem exclusiva e a clássica latinha de atum do parabéns coletivo.

*Novelinha: Conheça a história da Guda

4.5.09

Coração de pudim em surto!

Quem, em sã consciência e depois de passar o fim de semana inteiro trabalhando (para tentar tirar o atraso dos frilas), aceitaria dar lar temporário a três bebês rejeitados pelas mães e que não comem ração sozinhos? Quem? Quem?

Os camundongos chegam às 22h. Rezem por nós. :)

3.5.09

Lojinha virtual: Gatoca e Mopi pelos animais

Em um almoço de domingo, com direito à macarronada e suco aguado de melão, Fabi me contou que pretendia encerrar a lojinha do Mopi, para concentrar esforços nos projetos educativos. O porta-malas do Palio verde musgo espremia umas coisas tão lindas, que eu decidi aproveitar o dia de sol e fotografar tudo ali mesmo, no estacionamento do restaurante.

Pensei logo nas leitoras do blog. E na proximidade do Dia das Mães. Quem quiser dar uma força às meninas, basta escrever para fabiana@mopibichos.com.br. A boa ação terá peso dobrado, porque 10% de cada produto vendido será usado para cobrir as despesas com a estadia do Hórus em Gatoca, durante os meses de fevereiro, março e abril. :)

Canecas – R$ 10




Kits de esponjas – R$ 12



Nécessaire com kit de banho – R$ 12


Nécessaire bordada – R$ 15


Caderno para receitas – R$ 15


Caderno de endereços – R$ 15


Porta-chaves e correspondências – R$ 25


Bolsas de patchwork médias – R$ 50





Bolsa de patchwork grande – R$ 70

29.4.09

CCZ: notícias exclusivas sobre a manifestação!

Atualizado em 30 de abril de 2009

"Você não é a Bia Levischi? Menina, eu adoro suas crônicas! Acesso o blog várias vezes por dia, para ver se tem novidade. Seus bigodes são fantásticos!".

Enquanto a abordagem acima rolava do lado de fora do Centro de Controle de Zoonoses de São Paulo, representantes das maiores ONGs da cidade discutiam o futuro dos animais confinados do lado de dentro, sem comida, sem assistência veterinária, sem chance de adoção. Jornalistas "coração de pudim" não puderam participar, mesmo com todo o fã-clube presente.

E como as informações divulgadas no G1, no Virgula, no blog da Barbara Gancia e no SP Record soavam desencontradas, preferi caçar alguém que tivesse cruzado o portão do Carandiru dos bichos, antes de escrever qualquer coisa. Renato, do Projeto Natureza em Forma (responsável pela doação de mais de 3 mil cães e gatos, no antigo casarão da Av. Paulista), ficou até o fim da reunião com Marco Antonio Vigilato, o diretor do "presídio", e topou dar essa entrevista exclusiva ao Gatoca:

Quem participou da conversa de ontem?

Vou te falar na ordem em que o pessoal foi se apresentando: Feliciano Filho (deputado do PV), Luiz Scalea (ex-Associação Protetora de Animais São Francisco de Assis - Apasfa), Roberto Tripoli (vereador do PV), Carlos Rosolen (Projeto Esperança Animal – PEA), Nina Rosa (Instituto Nina Rosa), Silvana Andrade (Agência de Notícias de Direitos Animais – Anda), Sônia Fonseca (Fórum Nacional de Proteção e Defesa Animal e Sociedade Zoófila Educativa, representando a Elizabeth McGregor, da World Society for the Protection of Animals – WSPA), Barbara Gancia (Folha de S.Paulo e Band News), Julio César de Oliveira (vereador de Jundiaí), Luisa Mell ("De lugar nenhum, mas protetora de alma!"), Marco Antonio Vigilato (CCZ-SP), Regiane Souza (Coordenação de Vigilância em Saúde – Covisa), Rita Garcia (Programa de Proteção Animal da Covisa), Rogério Bráulio (CCZ-SP) e José Curti (Projeto CEL). Havia também um pessoal da Record, mas sem identificação.

E o que foi discutido nesse encontro?

Após as apresentações, cada um deveria explicar por que estava lá. Sônia começou, falando o que achava certo e errado no CCZ, e quis saber sobre o programa para a contenção da Leishmaniose. Nina Rosa insistiu na necessidade de segregação entre o controle das zoonoses e o trato de cães e gatos, por meio da construção de um novo prédio, com outros funcionários, triados pelo fato de gostarem de animais. Como as explanações demoraram muito, Luiz acabou encerrando a rodada de reivindicações.

Ele contou que esteve no CCZ dois meses antes da comissão de vereadores denunciar aquele cachorro comido pela bicheira e deu de cara com outro animal apodrecendo. Os funcionários disseram que o bicho havia acabado de chegar, mas as fichas acusavam uma estadia de sete meses, sem qualquer atendimento veterinário. Indignado, Luiz chamou a polícia e fizeram um boletim de ocorrência. O B.O. provava a divergência entre os números de resgates e eutanásias costumeiramente informados pelo órgão à imprensa.

"Por esse episódio, você não tem uma segunda chance!", ele disparou. Vigilato permaneceu de cabeça baixa o tempo inteiro, mexendo em seu BlackBerry. Tripoli cobrou datas (de feiras de adoção e de abertura das castrações para as ONGs) e finalmente passou a palavra ao diretor, que avisou que comentaria tópico por tópico, partindo da Leishmaniose. Quinze minutos depois, porém, Tripoli e Feliciano cochicharam, o segundo levantou, tomou-lhe o microfone e anunciou para a câmera da Record que, como estavam sendo enrolados, eles mesmos montariam um cronograma para o CCZ.

Todo mundo saiu da sala. Eu fiquei, com o Luiz e a Barbara, porque tinha propostas a fazer. Quando Silvana terminou de sabatinar Vigilato, apresentei-me e ofereci apoio voluntário para as feiras de adoção e os mutirões de castração. Mão de obra e inteligência, sem agressão. Ele respondeu que havia 200 animais lá dentro para doar, se eu quisesse entrar, e me mandou conversar com a Rita. Fui andando atrás dele, mas o advogado reforçou que a pessoa responsável era a Rita.

Questionei, então, se ela possuía autonomia para aprovar os projetos que a gente propusesse, porque se estivesse lá para barrar, eu não a conhecia e não teria pudores de ir para cima. Voltei para a sala com cara de bosta, acompanhando o advogado. Luisa Mell reclamava que a reunião fora marcada por ela para as ONGs e não para os parlamentares. Pelo menos os funcionários do CCZ pareciam preocupados. Como só enxergavam o portão abarrotado de gente e os gritos ecoavam absurdamente, deviam pensar que umas 15 mil pessoas estavam prestes a invadir o pátio e acabar com tudo.

Quais são os próximos passos?

Parece que uma nova manifestação ocorrerá, dessa vez em frente à prefeitura, para exigir que Gilberto Kassab tome uma atitude.

Fachada do CCZ que virou velório


Faixas para todos os gostos




Abraço pelos animais


Galera impedindo a passagem dos carros, na Av. Santa Eulália


Roberto Tripoli (vereador do PV) anunciando as ONGs que participariam da reunião com o Vigilato


Luisa Mell (ex-Late Show) conversando com Feliciano Filho (deputado estadual do PV)


Fábio Paiva (Holocausto Animal) e George Guimarães (Veddas)


Nina Rosa (Instituto Nina Rosa)


Simone (Pinxi), Virgínia Lee (irmã da Rita) e Dani Xavier (voluntária do AUG)


Gabriela Toledo (PEA)


Fabiana Pino (Mopi) e Fowler (Focinhos Gelados)


Cynthia, Dani Xavier, eu e Ju Bussab (AUG)


Organizadores do evento: Lilian Rockenbach (ex-Apasfa), Carlos Rosolen (PEA) e Ângela Caruso (Quintal de São Francisco)

28.4.09

Propaganda é a alma do negócio

Quatro amigas-jornalistas-amantes-de-animais toparam divulgar a manifestação que ocorrerá amanhã, em frente ao CCZ! Lucia Freitas é figurinha carimbada na blogosfera, Mônica Nunes coordena o Planeta Sustentável, da Editora Abril, Cristiane Senna escreve para a Marie Claire, da Globo, e Carolina Costa edita a AnaMaria, o Guindaste e o Retribua, além de colaborar para a Rede Ecoblogs. Obrigada pela ajuda, meninas! :)

Obs.: Nos links estão os respectivos posts.

26.4.09

Caverna de bigodes

Reparem no sofá da sul-africana que deixou o emprego de 22 anos para realizar o sonho de morar com nove guepardos, três leopardos, um leão, uma onça-pintada e dois lobos (foto 5). Agora, vejam o sofá de Gatoca e me dêem um bom motivo para não despachar os bigodes para o Azerbaijão:

22.4.09

Hora do show, Energia!

Depois que a Record denunciou as barbáries que acontecem no Centro de Controle de Zoonoses de São Paulo (parte 1, 2, 3 e 4), o apelo dos protetores por mudanças ganhou novo fôlego. Dia 29, às 13h, haverá uma super manifestação em frente ao CCZ, localizado na rua Santa Eulália, 86, próximo à estação Carandiru do metrô.

Várias organizações de referência estarão presentes: Instituto Nina Rosa, Adote um Gatinho, Projeto Esperança Animal, Veddas, Clube das Pulgas, Projeto dos Grandes Primatas, Aliança Internacional do Animal, Quintal de São Francisco, Movimento dos Protetores Independentes. E esta jornalista "coração de pudim" também.

Vamos dar um basta às mortes e ao confinamento de vidas saudáveis, sem comida, sem assistência veterinária, sem chance de adoção. A história do cartaz abaixo, infelizmente, se perde entre muitas outras. Divulguem, participem, arrastem os amigos, procurem uma louca usando camiseta de bigode em meio à multidão. ;)

Para ampliar, cliquem na imagem

21.4.09

Lá se vai minha obra de arte...

- Sabe o que seria perfeito para o Hórus, Mari?
- O quê?
- Um adotante que trabalhasse em casa, como eu. Assim, ele teria companhia em tempo integral e estranharia menos a mudança.
- Você não quer mais nada, né?

O problema é que o pequeno acabou instalado aqui no escritório (onde eu passo a maior parte do dia), por causa dos vômitos pós-castração, e criou uma falsa idéia de exclusividade. Como abrigar dois Mercvrivs sob o mesmo teto, se ninguém topar adotá-lo? Eis que, na tarde seguinte, eu recebo este e-mail de arrepiar até os fios de cabelo que já haviam caído da cabeça:

Olá, Beatriz!
Tudo bem? Eu moro em um prédio, no Alto de Pinheiros, em São Paulo. Comecei a trabalhar em casa recentemente e gostaria muito de uma companhia. Você sabe qual é a idade do Hórus?
[]s
Paulo


Bem que dizem que a gente deve tomar cuidado com o que pede! Respondi a mensagem do Paulo e fiquei ainda mais surpresa de constatar, ao longo do vai-e-vem de bits, que não precisaria convencê-lo sobre a importância das telas de segurança. Combinamos a entrega para depois da instalação, que demorou umas duas semanas, por culpa das mancadas da empresa.

No último sábado, a caminho do Alto de Pinheiros, metade de mim vibrava de felicidade, enquanto a outra metade planejava pegar o retorno na Marginal e esconder o doce de batata doce na gaveta das meias. E se ele se sentisse novamente abandonado? Acho que esse receio é que faz o coração de quem doa dividir o espaço com as lascas de madeira no depósito dos apontadores.

Cintia, a namorada, atendeu a campainha ostentando um sorriso de dar a volta na nuca, que não diminuiu com as proporções de javali do filhote (ufa!). Hórus saiu da caixa de transporte receoso, cheirou o sofá e sumiu de vista. Soube que a busca do casal por um peludo já durava meses e o tigrinho só ganhou a concorrência pelo nome. A engenheira de software adora mitologia egípcia e pretende tatuar o olho do deus celeste em breve.

No pet shop, enfiaram-lhe uma cama gigante de oncinha, areia de sílica, shampoo para banho a seco, brinquedinhos variados. O mal agradecido retribuiu a enxurrada de presentes se espremendo no fundo oco do rack da TV, esconderijo que nós só descobrimos após revirar o apartamento inteiro (incluindo a lixeira do banheiro e os eletrodomésticos da lavanderia).


Tirei meia dúzia de fotos da família recém-formada, despedi-me do companheiro de labuta e corri para alcançar o carro antes da primeira lágrima.


Hórus faz uma falta danada. O escritório ficou morbidamente silencioso sem os gritinhos empolgados quando a gente chega da rua ou quando o saco de ração dá sinais de vida na sala.


As cordinhas de pijama permanecem inertes, o rolo de papel higiênico inteiro, os ímãs no mural. Ninguém se joga no chão assim que a porta se abre, oferecendo o barrigão para um cafuné.


Nem seu rostinho desponta mais na janela da cozinha, enciumado pela presença de algum intruso no meu colo, durante o café da manhã.


Eu podia, sim, cuidar de mais um bigode. Mas Hórus não é mais um.



Epopéia do Hórus na busca por um lar:

:: Como tudo começou
:: Caçador de cabelo
:: Doce de batata doce
:: Festa do papel higiênico
:: Era uma vez um dente de leite...
:: Cera de ouvido para o jantar
:: Zé do Caixote