E não estou falando de preencher a agenda de cirurgia com os dados dos animais por ordem de chegada (respeitando a divisão entre bigodes e focinhos), prender as pulseirinhas na pata dianteira direita, tirar as dúvidas dos tutores, responder as mensagens da veterinária, colocar todo mundo nas caixas de transporte (mesmo os rosnadores), ajeitar nos quatro carros disponíveis e no caminhãozinho do Luis, dirigir até a clínica.
Ou de operar dezenas de bichos no mesmo dia.
Dr. Rodrigo e Dr.ª Ana Lúcia pilotando as tesourinhas, Adriana e Leda no suporte
Centro cirúrgico
Antes e depois
Técnica minimamente invasiva
Cuidado
Nem de forrar as caixas com tapete higiênico no pós-cirúrgico, separar a quantidade certa de remédio (segunda dose do vermífugo e antibiótico) para cada paciente, escrever mil cópias das instruções, ajeitar todo mundo nos carros e no caminhãozinho de novo, dirigir de volta a São Bernardo, entregar os peludos às famílias, enfatizando as recomendações veterinárias, acompanhar vários deles até suas casas.
Havia 11 voluntários para me ajudar nisso ― obrigada, Leo Eichinger, Mariana Levischi, Denise Granja, Fernando Paulino, Rosa Yukari, Casé Nagot, Tati Pagamisse, xará do Leo, Sheila Santos, Luis e irmã fofa! Obrigada, também, Carol Toledo, Paula Ramos, Amanda Herrera, Fernanda Dias, Dani Xavier e Bruno Fernando, pelo empréstimo das caixas. (Bruno tem um pet táxi que eu recomendo de olhos fechados, gente!)
Quando escrevo "complexidade da coisa", me refiro aos acontecimentos que fogem do nosso controle, como as desistências sem satisfação, a sialata que não estava em jejum e quase sufocou com o próprio vômito, as duas gatinhas em início de gestação que perderam os bebês, o cachorro com testículo ectópico (fora do lugar).
No percurso até Santo André, um dos meus passageiros deu uma de Houdini e fez xixi no carro inteiro.
E o feito virou piada comparado à notícia estarrecedora de que um dos cães do caminhãozinho havia estourado a caixa de transporte e desaparecido bairro adentro. Foram mais de sete horas de buscas ininterruptas, o mamão das 6h vencido no estômago, um par de pernas que mandaram lembranças o resto do mês. Em vão.
Às 16h, com os animais operados precisando retornar à comunidade, a gente resolveu pedir socorro à Jane ― nunca mais vou esquecer os olhos afogados da Emily, sua filha adolescente. E outras cinco horas de via-sacra motorizada e a pé por Santo André se sucederam. Não sobrou uma viela por onde nós não tivéssemos passado. Um morador que não tivesse ouvido o assobio da Jane. Um segurança do entorno do terreno onde Napoleão foi visto algumas vezes sem nosso telefone.
Perto das 22h, derrotados, um motoqueiro bateu no meu carro. Ainda faltou contar do Enzo, o poodlelata que passou a tarde no soro, por causa de uma crise de convulsão. Dr.ª Ana Lúcia cobrou apenas a aplicação do remédio, deu uma caixinha à família e insistiu que ele voltasse para investigarem a causa das convulsões, com desconto-vaquinha-o-que-precisasse. Deitei vazia.
Às 4h30, o celular me pegou acordada. Como faltam palavras no dicionário para descrever reencontros desacreditados, preferi filmar.
Napoleão foi adotado pelas meninas filhote, quando sua tutora, idosa, faleceu. Já tinha escapado uma vez e, aos 3 anos, só aceita as duas ― provavelmente, morreria na rua. Sem paciência com as marcações de território, o avô vive ameaçando doá-lo. A castração coroará o final feliz, assim que o fujão se recuperar do susto. :)
Enzo não sobreviveu. Liguei para a dona Maria Marinês na sexta, depois de passar a semana em curso, acordando às 6h e indo dormir às 24h, e fiquei sem reação, segurando o aparelho no ouvido. Como os exames cardíacos não acusaram nada, restou a suspeita de problema neurológico. E ela não me deixou ajudar com a conta do hospital. "Eu trabalho, meu marido trabalha, tenho uma filha professora, outra designer. Cada um pagou um pouquinho".
Percebendo meu silêncio constrangido, emendou: "As coisas acontecem na hora que têm de acontecer. O mutirão não deu certo para o Enzo, mas beneficiou outros animais, não é?". Dez cachorros (duas fêmeas e oito machos) e 27 gatos (dez fêmeas e 17 machos). Fora a segunda leva, que não pôde ser operada agora. "Então, não desanime. E venha aqui em casa, um dia desses, para tomar um café".
Nas madrugadas seguintes, quando o coração apertava, eu relia a mensagem da Ana Carolina, tutora da Ágatha:
E lembrava do sorriso das famílias na pracinha, recebendo seus amigos quadrúpedes.
Mutirão de castração é, definitivamente, para os fortes.
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6 comentários:
Parabéns,Beatriz!!!Não foi surpresa ver o sorriso da dra Ana e o dr Rodrigo.Eles realmente são pessoas especiais.Os três dogs que resgatei da rua,simultaneamente...porque um de cada vez é para os fracos rsrs foram atendidos por eles,com todo carinho e dedicação.Você e sua "turma" de anjos, merecem com certeza todo carinho e admiração.Beijos e Lambeijos para todos :)
Parabéns por essa iniciativa maravilhosa do mutirão! Chorei aqui de emoção, ainda bem q o fujão foi encontrado! Qto ao Enzo, infelizmente isso acontece, ninguém tem culpa, q bom q a dona sabe disso! Beijos
Bia, que post lindo!!!! Fiquei muito emocionada! !!! Obrigada por tudo que faz pelo mundo! !!! Bjs!!! Iris.
Parabéns pelo seu trabalho!
peço que se algum dia tiver esse mutirão na zona sul de São Paulo nos informe, porque seu trabalho é maravilhoso, é por aqui está cheio de gatos que precisam ser castrados, por favor!
Bjo Luana
Obrigada pelo carinho, meninas! :*
Gatoca é um projeto de educação, conscientização e mobilização, Luana. O mutirão no DER só ocorreu porque nosso financiamento coletivo superou o valor esperado: http://blog.gatoca.com.br/2014/10/os-leitores-mais-incriveis-do-mundo.html. :)
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